Imagine uma cena clássica do futebol. Jogadores dos dois times discutindo a marcação da arbitragem. A bola parada, esperando ser chutada. A torcida fervendo na arquibancada, quase invadindo o gramado. Tenso? Agora coloque um padre no meio dessa confusão. Sim, um padre. E na função de árbitro.
Em São Paulo, o religioso Ramires Henrique de Andrade pode se deparar com os desafios da mais patrulhada função dos gramados. Ele acaba de se formar juiz de futebol e fará sua estreia na temporada 2013.
Sacerdote responsável pela Paróquia de São José, no bairro do Ipiranga, capital do Estado, padre Ramires se formou no curso de preparação da FPF (Federação Paulista de Futebol) no fim do ano passado. A partir de fevereiro, ele deve aparecer em escalas de partidas de divisões menores, no princípio de trajetória convencional de um árbitro iniciante. O novato diz estar pronto para o lado mais bruto do futebol, inclusive para os diálogos mais ríspidos.
"Como padre, ouço muitas histórias, no sacramento e no contato com a comunidade. Coisas boas e coisas difíceis da realidade das pessoas. Claro que no campo de futebol, na relação com o jogador e com a torcida, você precisa ter uma outra disposição interior. Você tem que ter uma frieza, um equilíbrio para se adaptar a essas situações", afirma o novo árbitro de 31 anos.
Padre Ramires viu nascer a paixão pela arbitragem quase paralelamente ao despertar da vocação religiosa. Pouco antes de ingressar no seminário, o adolescente fã de futebol já apitava partidas amadoras em sua cidade, Tocos do Moji, no sul de Minas Gerais.
"Sempre faltava quem iria apitar. Talvez por esse espírito de liderança, por gostar muito de futebol e por assistir a muitos jogos, eu tinha já uma boa noção. Lembro até do meu primeiro apito, de quando eu consegui ele. Lembro que os cartões eu confeccionava em casa mesmo, o amarelo e o vermelho. São ocasiões muito agradáveis", diz o padre, que encarou preparação de um ano e meio, passando por três testes teóricos e outros três práticos.
No entanto, a retomada do sonho de árbitro teve de esperar alguns anos, até a estabilidade da vida na Igreja Católica. Para ir ao universo do futebol, contou com a anuência dos clérigos superiores da congregação de religiosos de Nossa Senhora do Sion.
A expectativa de padre Ramires é dar os primeiros passos na arbitragem paulista nas categorias sub-11 e sub-13. Mas o horizonte do religioso é comum a qualquer iniciante no apito e aponta no futuro para os palcos mais importantes, com o desejo de mediar grandes clássicos.