RESISTÊNCIA: Povo indígena Karipuna tenta proteger território de grileiros, madeireiros e invasores em RO

Desafio é gigantesco: área é maior do que a capital de São Paulo

RESISTÊNCIA: Povo indígena Karipuna tenta proteger território de grileiros, madeireiros e invasores em RO

Foto: Felipe Corona/Rondoniaovivo

Nos últimos anos, a Amazônia sempre esteve nos noticiários de todo mundo. A preocupação com a destruição crescente de um dos ecossistemas mais importantes do planeta, por conta de propostas que afrouxaram as leis ambientais no Brasil, além do desmonte dos órgãos de fiscalização públicos, voltaram as atenções para a região Norte do país.

 

Por isso, o povo indígena Karipuna, que está localizado entre os distritos de Jacy-Paraná e União Bandeirantes, pertencentes a Porto Velho, capital de Rondônia, tem um grande desafio: proteger seu território que sofre invasões sistemáticas de grileiros, madeireiros ilegais e grandes latifundiários de soja ou da pecuária.

 

Para ter uma dimensão do trabalho dos indígenas, a pequena vila que é sede da Terra Indígena Karipuna fica a cerca de 150 quilômetros por estradas de asfalto e barro (cerca de cinco horas de viagem com caminhonete com tração nas quatro rodas).

 

Karipunas levam Rondoniaovivo para diversos pontos do território que foram alvo de criminosos - Vídeo: Felipe Corona

 

Segundo dados oficiais da antiga Fundação Nacional do Índio (Funai, hoje Fundação Nacional dos Povos Indígenas) acessados pelo Rondoniaovivo, a Terra Indígena Karipuna foi demarcada em 1997 com 152.930 hectares e se encontra homologada pelo decreto s/nº de 09/09/1998, com registro nos cartórios de imóveis de Guajará-Mirim e Porto Velho.

 

Fazendo a conversão, a área tem 1.529,3 quilômetros quadrados é maior do que milhares de municípios brasileiros, incluindo São Paulo (SP) que tem 1.521,110 km² e Viamão, na região metropolitana de Porto Alegre (RS), com 1.496,515 km².

 

De acordo com André Karipuna, uma das lideranças do povo que recebeu o Rondoniaovivo durante visita, as incertezas e o medo tomaram conta de todos os indígenas da vila por muito tempo.

 

Marcas da destruição estão por todos os lados - Fotos: Felipe Corona

 

“Com os discursos de ódio contra os indígenas, os invasores se sentiram apoiados e fortalecidos para fazer todo o tipo de crimes contra a gente. Nossa maior preocupação são os grileiros de terras, que passam os seis meses do verão amazônico em nossas terras. Eles derrubam tudo, tiram a madeira, vendem, limpam o terreno com fogo e depois negociam o lote”, lamentou ele.

 

De acordo com os próprios Karipunas, hoje a Reserva Extrativista (Resex) de Jacy Paraná, vizinha à TI Karipuna, é a segunda região mais desmatada da Amazônia, contando com quase 200 mil cabeças de gado sobre a área.

 

Segundo o povo, a situação que eles vivem não é de desconhecida pelos Governos Federal e Estadual. São dezenas de documentos formais, de comunicados de organizações da sociedade civil e determinações enviadas pelo Ministério Público Federal (MPF).

 

Esse fato já foi alardeado para a antiga Fundação Nacional dos Indígenas (Funai), MPF e até para a Polícia Federal.

 

Madeireiros deixaram peças preparadas para serem beneficiadas e vendidas assim que saíssem de área invadida ilegalmente

 

Segundo o Prodes (Projeto de Monitoramento do Desmatamento na Amazônia Legal por Satélite), sistema do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), a TI Karipuna é a nona terra indígena mais desmatada do país entre 2015 e 2021, período em que 4.754 hectares foram ilegalmente devastados no território.

 

Viagem

 

Subindo os rios Jacy-Paraná e Formoso com a equipe de reportagem do jornal eletrônico, durante três horas em voadeira, André mostrou vários pontos que eles tiraram fotos, fizeram vídeos e relatos para as autoridades como Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais) e Ministério Público Federal.

 

André Karipuna detalhou como a ação de invasores, grileiros e madeireiros destruiu grandes espaços dentro da terra indígena.

 

“Foram três anos de ações intensas na nossa área. A gente calcula que foram mais de 3 mil árvores retiradas daqui, com média de mil toras por ano. Sentimos muito medo, pois era uma turma que sempre andava armada, muito agressiva, que mandavam recados ameaçando nossas vidas”.

 

Invasores não se preocuparam com nenhum tipo de incômodo; construíram até uma ponte para atravessar toras de madeira para uma proprieade que fica ao lado da terra indígena

 

Uma das marcas da ousadia dos criminosos foi a construção de uma ponte que cruzava o Rio Formoso, da Terra Karipuna para uma fazenda vizinha à região, onde os madeireiros transportavam as toras por caminhões para serem negociadas.

 

A construção com toras de madeiras e sustentadas por cabos de aço foi destruída com dinamite após uma operação conjunta da Polícia Federal e o Ministério Público Federal na região, que aconteceu somente em meados de dezembro do ano passado.

 

“Esse pessoal trabalhava seis meses na época do verão, e ficavam seis meses fora, no inverno. Porém, trabalhavam dia e noite aqui. Não paravam. Depois de tantas denúncias e provas que enviamos, a operação policial parece que deu um freio neles. Parece que estão com medo”, comentou André.

 

Viagem de ida e volta por parte de toda a TI durou quase seis horas contando ida e volta; porém, dois invasores foram avistados

 

Contudo, durante nossa pequena viagem pela região, encontramos dois invasores fazendo uma espécie de mapeamento em uma das margens do Rio Formoso.

 

“Desde a operação policial que a gente não via ninguém aqui. Isso é um sinal de que eles estão querendo voltar para derrubar a floresta”, afirmou o líder indígena.

 

André Karipuna parou em um local que fazia semanas que não tinha recebido a presença dos invasores ilegais. Porém, eles deixaram rastros de que estiveram ali há pouco tempo, relativamente perto da vila do povo indígena que tenta proteger a área dos criminosos.

 

Rastros de queimadas deixados por criminosos que tinham deixado território após operação da Polícia Federal e Ministério Público Federal

 

Apoios

 

Os Karipunas vivem como a maior parte dos indígenas do Norte do país: plantam, pescam e caçam para sobreviverem. O que sobra, vendem sob encomenda, como as Castanhas-do-Brasil (também conhecida como Castanha-do-Pará) e farinha d’água.

 

De acordo com eles, com o enfraquecimento das políticas ambientais pelo então governo de Jair Bolsonaro (PL), restou pedir socorro apenas para entidades da sociedade civil e a imprensa nacional e internacional.

 

Uma dessas entidades é a Pastoral da Terra, ligada à Igreja Católica. Quando o Rondoniaovivo retornou para Jacy-Paraná, no barco em que André Karipuna levou a todos, a irmã Laura Vicuña Pereira Manso, da Congregação das Irmãs Catequistas Franciscanas, ficaria na vila deles por seis dias para verificar novamente a situação da destruição deixada pelos invasores, grileiros e madeireiros.

 

Irmã Laura Vicuña Pereira Manso, ligada à Pastoral da Terra da Igreja Católica, atua na tentativa de proteger terra indígena de ilegalidades e crimes - Divulgação/CNBB

 

“Em 2017, os Karipunas entraram em contato conosco e pediram nossa ajuda, para que chamássemos a atenção para a situação de terror vivida por eles. Então, de lá para cá, estamos mobilizando várias entidades nacionais e internacionais sobre isso. Inclusive levamos o André para várias embaixadas em Brasília (DF) para que contasse pessoalmente os fatos”, destacou ela.

 

E esse apoio rendeu ações concretas para eles: há dois anos, a embaixada da Alemanha instalou duas estações de energia solar para a vila, que custaram cerca de 200 mil reais. É a única fonte constante de energia do local, que conta apenas com um pequeno gerador à gasolina, mas que funciona apenas por algumas horas, nos dias em que as baterias não são carregadas, justamente nos dias mais nublados.

 

A benfeitoria possibilitou que os Karipunas tivessem acesso à internet e antenas para assistirem TV por assinatura, por exemplo. Um pequeno luxo no meio do isolamento da floresta.

 

Estrada possibilitou invasores transitarem livremente pela área pertencente aos Karipunas

 

Depois de tanto medo de serem expulsos da própria terra, com ameaças e ações de destruição da floresta, os sentimentos dos Karipunas já é diferente do que visto em anos anteriores.

 

“A gente sabe que não vai mudar tudo de uma hora para outra, mas que vai melhorar pelo menos um pouco. O discurso já é diferente, as ações são outras. A gente espera só que tenhamos um pouco mais de paz para sobreviver. Não é fácil dormir sem saber o que vai acontecer no futuro. Mas vamos lutar para manter nossa cultura, tradições e território”, observou André Karipuna.

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