SAÚDE: Pacientes recorrem às redes sociais para conseguir medicamentos caros

Mais de 50 mil pessoas dependem das farmácias de alto custo, no Distrito Federal. Pacientes relatam o drama de conseguir a medicação. Muitos obtêm ajuda nas redes sociais

SAÚDE: Pacientes recorrem às redes sociais para conseguir medicamentos caros

Foto: Divulgação

"Felizmente, ainda não tive nenhum agravamento clínico, por conta da falta de remédios. Mas a mente fica bem conturbada." Este é o relato da professora Karla Viviane Veloso, 40 anos. Ela depende da farmácia de alto custo para conseguir duas medicações indicadas ao tratamento de um pós-transplante de fígado, feito em 2013. A Secretaria de Saúde (SES-DF) reconhece o problema. Atualmente, estão em falta 39 remédios adquiridos pelo órgão e 19 do Ministério da Saúde, totalizando 58. Um deles é a Ciclosporina 50mg, o qual a moradora do Gama precisa tomar todos os dias.

 

"Cheguei a ficar três meses sem a ciclosporina em 2019, pouco tempo antes da pandemia, por falta de estoque. Foi um período tenso", lembra. "Este mês, por exemplo, só trouxe a de 100mg, porque a de 50mg está em falta há 15 dias e preciso tomar 150mg", destaca Karla. Ela conta que faz parte de um grupo de apoio no WhatsApp e, conversando com alguns colegas, consegue suprir a falta dos medicamentos. "Naquele período de três meses, cheguei a pensar em entrar com um processo. Só não fiz isso por conta dessa rede de apoio, que sempre ajuda muito. Quando alguém tem algum remédio em excesso, sempre oferece para quem está precisando", relata.

 
 
Karla Viviane revela que, nos momentos de aperto, também pensou em comprar os medicamentos. "Só que é muito caro. Cada um custa, em média, R$ 600", ponderou. Ela conta, ainda, que chegou a ficar três dias sem a medicação. "Para o meu tratamento, é considerado algo preocupante, pois pode causar alterações clínicas referentes ao transplante fazendo, inclusive, crescer o risco de rejeição, o que poderia levar a um novo transplante. Ou seja, voltaria tudo de novo", aponta a professora.
 
 
Apreensão
 
Transplantada cardíaca, Elaine Gomes, 46, afirma que faz uso do tacrolimo desde a data da cirurgia, em outubro de 2015. "Meu primeiro contato com a farmácia de alto custo foi quando recebi alta, em que foram entregues alguns formulários necessários para aquisição do medicamento", comenta. Ela conta que, no início, além do tracolimo, utilizava azatioprina. Porém teve que suspender o segundo remédio. "Quando fiz exames, 30 dias após o transplante, foi constatado que eu estava com o citomegalovírus reativado e a taxa estava muito alta, por causa desse último medicamento", detalha.
 
 
O médico de Eliane decidiu, então, testar outro imunossupressor, o everolimo. "A gente sabia que essa medicação não era indicada para transplantados de coração, só que o experimento que ele fez comigo, deu certo, e as taxas zeraram", lembra. "A partir daí, fomos atrás de conseguir o medicamento, já que meu transplante era cardíaco", conta. No começo, em abril de 2016, Elaine afirma que o próprio hospital onde ela fez a cirurgia fornecia, enquanto ela resolvia a questão na Justiça. "Só que chegou uma época que não tinha mais, foi quando tive que comprar uma caixa para 15 dias e paguei mais de R$ 2 mil", recorda. "Obtive uma tutela antecipada e o GDF passou a me fornecer o remédio até o juiz decretar a sentença que, no final, foi favorável."
 
 
Atualmente, ela conta que everolimo está em falta e o hospital teve que voltar a fornecer a medicação. "Fico sempre apreensiva, pois é o que faz com que o nosso órgão não seja rejeitado ou rejeite o corpo. Sou dependente do remédio para toda vida e a falta prejudica o transplante. O maior desgaste, para mim, é esse. O alívio só vem quando o juiz decide favoravelmente", desabafa a aposentada.
 
 
Outro que faz parte do grupo de apoio é Dilvan Ferreira, 52. Aposentado por conta de uma insuficiência renal, o morador do Novo Gama conta que tem 27 anos e 8 meses de transplante de rim, que foi doado pela irmã. "Desde então, faço uso do ciclosporina, de 100mg e 50mg. Infelizmente, por falta de gestos do governo — seja ele qual for —, todo ano, pelo menos três vezes, falta algum deles", lamenta. Ele afirma que precisou entrar várias vezes na Justiça, para conseguir suas medicações. "As últimas foram no ano passado, creio que em junho e setembro, e sempre tive sucesso na minha reclamação", ressalta.
 
 
Assim como Karla, o aposentado também elogia o grupo de apoio do WhatsApp. "Ele é de nível nacional, e acaba se tornando um auxílio. Um ajuda o outro quando tem falta de medicamento. Nessa semana mesmo, enviei remédio para um colega de Mogi das Cruzes (SP)", revela. "Nunca deixei de tomar, mas soube de muitos que ficaram ou tomaram uma dose menor que a necessária, para economizar. Eu, mesmo sem ter boas condições financeiras, tive que comprar, alguns anos atrás", recorda Dilvan, dizendo que, na época, gastou cerca de R$ 1,5 mil. "O último valor que a Defensoria Pública conseguiu bloquear do GDF, para eu comprar os medicamentos, foi de mais de R$ 4 mil. Não saquei todo o dinheiro, pois chegaram os medicamentos na farmácia de alto custo", detalha.
 
 
Respostas
 
A Secretaria de Saúde diz que existe uma programação para aquisição dos medicamentos de alto custo: algumas compras são feitas pelo órgão, enquanto outras são realizadas pelo Ministério da Saúde, que encaminha as medicações aos estados. "Quando os estoques chegam ao ponto de ressuprimento, o que ocorre, em média, faltando três meses e meio para a reposição do estoque, é emitido o pedido de aquisição", destaca a nota da pasta.
 
 
A SES-DF destaca ainda que as compras respeitam os prazos das leis que regem os processos licitatórios. "É importante lembrar que, muitas vezes, o processo pode fracassar, ou pode ser abandonado. Também podem haver problemas de entrega por parte do fornecedor ou falta do medicamento no mercado", ressalta o texto enviado pela secretaria.
 
 
O órgão de saúde local diz que, por meio do Componente Especializado da Assistência Farmacêutica (CEAF), assiste cerca de 43 mil pacientes com medicamentos de alto custo no Distrito Federal, além de mais de 13 mil famílias, que não podem se locomover até as unidades de farmácias de alto custo. "Antes de serem cadastrados no CEAF, os pacientes devem cumprir os critérios estabelecidos pelo Ministério da Saúde, ou pelos protocolos clínicos da SES/DF, a depender do medicamento solicitado", conclui a nota. Confira, no QR Code, o site com todas as informações sobre o serviço.
 
 
O Ministério da Saúde não se manifestou sobre o assunto.
 
 
Onde encontrar farmácia de alto custo no Distrito Federal
 
Asa Sul
Endereço: Estação 102 Sul do Metrô, Subsolo — Ala Comercial
Horário: segunda a sexta, das 7h às 19h; sábados, das 7h às 12h, mediante distribuição de senhas ao longo do dia
 
Ceilândia
Endereço: EQMN 18/20, Praça do Cidadão
Horário: segunda a sexta, das 7h às 19h; sábados, das 7h às 12h, mediante distribuição de senhas ao longo do dia
 
Gama
Endereço: Praça 01, Área Especial, Setor Leste
Horário: segunda a sexta, das 7h às 19h; sábados, das 7h às 12h, mediante distribuição de senhas ao longo do dia
 
 
O alto valor das farmácias
 
Os medicamentos de alto custo, também chamados de medicamentos especiais, não são facilmente encontrados em farmácias e drogarias. Isso ocorre porque, além do alto preço de compra, eles demandam transporte e armazenamento "especiais". Esses fármacos são usados em tratamentos complexos. Os preços de aquisição, aqui no Brasil, ficam em torno dos R$ 800, mas, em alguns casos, podem chegar até R$ 1,4 milhão.
 
 
O Ministério da Saúde (MS) estima que, aproximadamente, 13 milhões de brasileiros tenham alguma doença rara e possam eventualmente precisar recorrer a algum tipo de medicamento especial. Não são todos os estabelecimentos farmacêuticos que oferecem medicamentos especiais, pois, além do alto valor de aquisição, eles possuem algumas particularidades na hora da compra, transporte, armazenagem e dispensação.
 
 
O Programa Farmácia Popular, do SUS, além de grande parte dos Postos de Saúde, dispõe de uma lista com cerca de 560 medicamentos que podem ser retirados gratuitamente pela população. Esses medicamentos são divididos conforme o tipo de doença, em medicamentos para tratamento básico, estratégicos e especiais. Cerca de 147 medicamentos e tratamentos de doenças raras (incluindo a medicação) são disponibilizados gratuitamente pelo SUS.
 
 
Algumas farmácias privadas também comercializam medicamentos especiais, mas, como o preço é muito alto, grande parte da população não tem condições de adquiri-los. Para isso, o MS criou o Programa de Medicamentos Excepcionais, ativo desde 1993 no SUS, em que algumas farmácias públicas, postos e hospitais fazem a distribuição de medicamentos de alto custo. Apesar disso, ainda existem muitos tratamentos que não são encontrados no SUS. Nesses casos, o paciente deverá acionar a justiça, informando que não dispõe de recursos próprios suficientes para adquirir o medicamento especial para seu tratamento.
 
 
O Poder Judiciário brasileiro tem o dever de fazer cumprir políticas públicas eventualmente deficitárias ou inoperantes e suas decisões precisam, necessariamente, considerar as prescrições contidas nos protocolos clínicos, diretrizes terapêuticas e as relações de medicamentos previstas no Componente Especializado da Rename (Relação Nacional de Medicamentos Essenciais), já que o procedimento técnico de escolha dos fármacos envolve várias etapas e profissionais, o que não pode ser ignorado quando da prolação de decisões.
 
 
As farmácias de alto custo representam um ente fundamental para a sociedade e os gestores da saúde devem imprimir o máximo de esforços para dirimir esse problema e tornar o acesso aos medicamentos de alto custo satisfatório, mais amplo possível e sobretudo, acessível, para, assim, vislumbrarmos um país mais digno, em que um dos direitos fundamentais, como o direito à saúde, seja uma realidade para toda a população.
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